quarta-feira, 2 de março de 2011

Fragmento - Ethan e Annie

-Sobre o que você está pensando? – perguntei.
-Tente descobrir.
-Já disse que você é difícil de ler.
Jogando a fumaça ela começou a me encarar com a cabeça inclinada.
-Você sumiu.
-É nisso que você está pensando?
-Você sumiu.
Eu não sabia bem o que dizer. Optei por ficar calado, quem sabe ela não insistiria.
-Por quê? – insistente.
-Eu... bom, não pensei que você daria minha falta, afinal, só conversamos uma vez.
-Foi diferente.
Sorri e olhei para baixo. Ela havia pensado em mim, sentido minha falta. O que eu mais temia e o que eu mais queria.
-Pensei que para você não havia sido.
-Porque não seria?
Não tinha explicação.
-Não sei.
-Então não tome conclusões precipitadas Ethan. O mesmo que você sentiu eu posso ter sentido, ou não.
-O que você sentiu?
Nessa hora um garçom veio nos servir. O olhei irritado.
-Boas noites, já escolheram o pedido?
Annie me olhou e riu. Ela pediu uma cerveja e eu um whisky. Quando ele se retirou Annie tocou a minha mão na mesa. Dessa vez eu não tirei. Ela me olhava com os olhos cheios de emoção.
-Como eu me senti... não sei ao certo, só parecia estar muito leve e as coisas muito mais bonitas e simples. Como se eu pudesse fazer tudo.
-Como se você não fizesse...
-Estou falando sério Ethan, não me reservei com você.
-Mentira. – disse ao lembrar dela me repelindo sobre pensar em lhe dar um beijo.
Chegando o corpo mais pra frente foi à vez dela me perguntar.
-O que você sentiu?
Eu iria me odiar por isso.
-Normal.
Uma sobrancelha dela arqueou-se levemente. Ela encostou-se à cadeira novamente.
-A pouco você confirmou o que eu disse sobre ter sido diferente.
Droga, ela me deixava irracional.
-Er... foi diferente, mas...
-Não precisa dizer. Já disse que dentro dos seus olhos existem palavras mais do que qualquer coisa que tenha dito
Fiz uma careta. Eu não entendia porque estava sendo tão frio. Acho que era pra ela se irritar e se afastar de mim. Só de pensar nisso a minha barriga revirou. O garçom chegou com as bebidas e perguntou se queríamos comer algo, recusamos.
-Me desculpe. – disse.
-Pelo o que?
-Por ser assim, tão idiota.
Ela riu e concordou com a cabeça.
-Você vai embora?
Seu rosto ficou nebuloso.
-Vou.
Eu tinha que ser justo. Ela ficou em silencio por um tempo encarando a parede e quando olhou para baixo disse:
- Eu precisava que você me dissesse. Talvez isto seja ousado... Mas estou esperando você ficar para o final feliz
-Da sua história?
-Da nossa história.
-Como você sabe que ela existe?
-Eu posso sentir. Nada do que aconteceu foi em vão. E eu não sentia cada emoção sozinha. Eu sei que você compartilha disso.
-Eu não posso.
-O que?
-Não posso ficar para o final feliz. Eu estragaria tudo.
-Eu não vou deixar.
-Você não pode controlar tudo.
-Não posso, mas eu posso me esforçar para não ficar irritada por cada burrada que você fizer ou disser, assim como essa.
-Você não sabe com o que está lidando Annie.
-Então me mostre.
Gelei.
-Não quero lhe machucar.
-Eu confio em você, sei que não o faria.
Tirei a minha mão da dela bruscamente e apertei a mesa com os dentes trincados.
-Droga Annie, não seja tão confiante da segurança da minha companhia. Eu posso lhe proteger de tudo e todos, com exceção de mim mesmo.
-Eu não quero ser protegida de você.
Virei a metade do copo de whisky e acendi um cigarro. Maldição!
-Chega! – disse fechando os olhos.
Ela apagou o resto do seu cigarro e colocou a cabeça abaixada nos cotovelos. Abrindo os olhos eu disse:
-Não me prive de lhe ver.
-Você é o único que está erguendo barreiras aqui. – ela disse com a cabeça ainda abaixada.
Delicadamente levantei seu queixo e acariciei seu rosto. Era como se a palma da minha mão pegasse fogo. Ela era tão delicada, poderia esmagá-la com um simples aperto. Fechou os olhos e sorriu.
-Eu quero você assim.
Sorri e ela beijou a palma da minha mão.
-Você não deveria me querer.
-Nós não escolhemos por quem apaixonar.
Estaquei. Essas eram as minhas palavras. O meu sentimento, só que ao contrario dela, eu não mergulhei nessa paixão de cabeça, ela parecia disposta a aceitar tudo. Eu precisava ir embora agora mais do que nunca. Se não estaria tudo perdido. Mas eu queria lhe dar esperança. Apaguei o cigarro no cinzeiro.
- Sonhe com os dias que virão. Quando eu não terei que te deixar sozinha.
Ela me encarou. Vazia novamente.
-Você vai agora?
-Sim.
-Você vai voltar?
Eu não poderia responder a isso e acho que ela entendeu. Tirei uma nota da jaqueta de couro que daria para pagar mais cinco cervejas e coloquei na mesa. Ela se levantou assim como eu. Cheguei tão perto que consegui sentir seu coração. Segurando um lado do seu rosto e com a outra a sua mão lhe dei um beijo na testa. E antes que ela pudesse reagir, eu já estava na rua, seguindo o caminho contrário à lua.